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Ferro dos 6 aos 12 meses

Quais as necessidades de ferro dos 6 aos 12 meses?

A partir dos 6 meses, devido ao rápido crescimento e ao aumento da atividade motora, o leite materno exclusivo ou a fórmula infantil não conseguem suprir as necessidades nutricionais do lactente, que são menores em gordura e maiores em hidratos de carbono e alguns micronutrientes, como o ferro (1, 2, 3, 4, 5). De acordo com a ESPGHAN, a alimentação complementar deve ser introduzida entre as 17 e 26 semanas de vida uma vez que as funções renais e gastrointestinais estão suficientemente maduras para metabolizar os nutrientes, incluindo os alimentos ricos em ferro, como carne e/ou alimentos fortificados com ferro (3, 5, 6). De facto, entre os 6 e os 12 meses, as necessidades de ferro por quilograma de peso corporal são maiores do que em qualquer outro período da vida (7).

Diferentes autoridades recomendam uma ingestão diária de ferro entre 7,8 a 11 mg, entre os 6 e os 12 meses (2, 7). Em Portugal, a DGS refere que o lactente necessita de garantir uma ingestão diária de 7mg de ferro (5).

E como são calculadas estas necessidades? Adicionando a quantidade de ferro perdida (principalmente pelas células epiteliais descamadas da pele e dos tratos intestinais e urinários) às quantidades de ferro necessárias para aumentar o volume sanguíneo, a massa do tecido e armazenar ferro durante esse período (2).


Quais os grupos de risco de deficiência de ferro ou anemia por deficiência de ferro?

A anemia é caracterizada por uma diminuição no número de glóbulos vermelhos, às vezes com tamanho ou forma alterados, a um nível que prejudica a capacidade fisiológica normal do sangue de transportar oxigénio para as células do corpo (9). A prevalência de anemia por deficiência de ferro em bebés europeus é normalmente <2% antes dos 6 meses de idade e aproximadamente 2% a 3% entre 6 e 9 meses (7). Em Portugal, temos uma prevalência de anemia na criança de cerca de 14% (OMS - Global Health Observatory Data Repository / World Health Statistics).

Geralmente os bebés utilizam o ferro armazenado durante os últimos meses de gestação, no entanto, após os 4–6 meses de idade, as reservas podem diminuir ou esgotar-se (8). Isto é exacerbado quando há reservas inadequadas de ferro, sendo que estes são alguns dos grupos de risco para deficiência de ferro (2, 5, 7, 8):

  • Bebés com baixo peso ao nascer (<2500g) ou que tenham sofrido restrição de crescimento intrauterino;

  • Bebés prematuros (<37 semanas);

  • Bebés com clampeamento precoce do cordão umbilical;

  • Bebés com crescimento rápido;

  • Bebés cujas mães sofreram de anemia, hipertensão ou diabetes durante a gravidez;

  • Bebés com perda de sangue devido a infeções parasitárias intestinais;

  • Bebés com ingestão inadequada de ferro pela dieta (ex.: baixo consumo de carne ou alimentos fortificados em ferro, dieta vegetariana estrita ou semivegetariana, introdução precoce de alimentos complementares à base de cereais, alimentação prolongada com leite);

  • Bebés com uma elevada ingestão de leite de vaca e dos seus derivados.


Como prevenir a deficiência de ferro?

A Organização Mundial da Saúde (OMS) refere que a suplementação diária de ferro (10-12,5 mg/dia de ferro elementar em gotas) é recomendada por 3 meses consecutivos num ano, como uma intervenção de saúde pública para prevenir a deficiência de ferro e anemia em bebés de 6 a 23 meses que vivem em locais onde a prevalência de anemia é ≥40% nesta faixa etária, sendo esta uma recomendação forte, com qualidade moderada de evidência (8).

No entanto, como já foi referido, em Portugal temos uma prevalência de anemia na criança de cerca de 14%, pelo que esta suplementação não é obrigatória, sendo apenas recomendada (cerca de 1-3 mg/kg/d) pelo profissional de saúde que acompanha o lactente quando se verifica a necessidade (5). Contudo, a Sociedade Portuguesa de Pediatria referiu em 2012 que: “o ideal aponta para a amamentação exclusiva até aos 6 meses de vida, seguida por suplemento de ferro de 1 mg/Kg/dia dos 6 aos 12 meses ou até se obter um suprimento diário de 11mg/dia de ferro através dos alimentos” (9). Por esse motivo muitos médicos optam por suplementar por sistema os bebés entre os 6 e os 12 meses. Este suplemento deve ser dado à refeição, porque o veículo do ferro elementar na única formulação em solução oral para lactentes é melhor absorvido com os alimentos (9).

No entanto, a suplementação em bebés com boas reservas de ferro pode ter efeitos adversos, como por exemplo, risco aumentado de infeções, crescimento prejudicado, alterações na absorção de outros minerais e efeitos gastrointestinais, como diarreia, vómitos, e alterações na microbiota intestinal (7, 10). Além disso, os bebés têm a capacidade de regular positivamente a absorção de ferro quando as necessidades de ferro aumentam (7).

O Comité de Nutrição da ESPGHAN concluiu por isso que não há evidência convincente de que os suplementos de ferro devam ser fornecidos a bebés com peso normal ao nascer, amamentados exclusivamente durante os primeiros 6 meses de vida em populações com baixa prevalência de anemia por deficiência de ferro entre crianças de 6 meses, como é o caso de Portugal, sendo sugerido apenas que os suplementos são recomendados para bebés amamentados por mais de 6 meses e que não consomem ferro suficiente através de alimentos complementares (7). Para além disso, por serem um grupo de risco, os bebés com peso ao nascer entre as 2000 e as 2500 g devem receber suplementos de ferro de 1–2 mg/kg/dia, começando às 2-6 semanas de idade e continuando até aos 6 meses, independentemente de terem nascido a termo ou prematuramente (7). Bebés que nasçam com menos de 2000g devem receber suplementos de ferro na dose de 2 a 3 mg/kg/dia (7).

Independentemente da toma ou não de suplementos de ferro, o possível esgotamento das suas reservas a partir do 4º - 6º mês e o reconhecimento das consequências da sua deficiência no desenvolvimento cognitivo, levam a que sejam aconselháveis as seguintes intervenções para prevenir a carência de ferro (2, 7, 9):

  • suplementação de ferro em mulheres grávidas;

  • atraso do clampeamento do cordão umbilical;

  • introdução de alimentos ricos em ferro a partir do 6º mês (ex.: carne e alguns vegetais);

  • fortificação de alimentos e fórmulas infantis com ferro;

  • evicção do leite de vaca.


Como melhorar a absorção de ferro nas refeições principais e lanches?

Existem duas formas de ferro: o ferro não hémico (de origem vegetal ex.: tomilho/orégãos/salsa/alecrim secos, cereais enriquecidos, feijão, lentilha, grão, caju, tremoço, agrião, endívias, couve-galega, espinafres) e o ferro hémico (de origem animal ex.: carne, peixe, ovo). Contudo, existe uma diferença no teor e na biodisponibilidade do ferro presente em alimentos de origem animal e vegetal, sendo que o de origem animal é absorvido em 25%, enquanto o de origem vegetal é absorvido apenas em 2-13% (5). Além disso, a absorção de ferro não heme do leite materno é geralmente considerada como sendo de até 50% e a absorção de fórmulas infantis e alimentos complementares fortificados com ferro é considerada de aproximadamente 10% (7).

Alguns componentes da dieta promovem a absorção do ferro não hémico, tais como o ácido ascórbico ou vitamina C (ex.: pimento, citrinos, couve de bruxelas, kiwi, papaia, couve portuguesa), o ácido cítrico (ex.: citrinos), as proteínas da carne e o leite humano (5, 7, 9).

Outros componentes da dieta inibem a sua absorção, tais como os fitatos (ex.: leguminosas, soja, frutos gordos, tofu), os polifenóis (ex.: leguminosas, chá, infusões, chocolate e café), o cálcio e o leite de vaca (5, 7).


Assim sendo, a partir dos 6 meses, deve ser oferecido ao lactente nas refeições principais um alimento rico em ferro (ex.: carne, peixe, ovo, leguminosas, feijão, lentilha, grão, legumes de folha verde escura) e um alimento rico em Vitamina C (ex.: kiwi, pimento, frutas cítricas, couve de bruxelas, papaia, couve portuguesa) para ajudar na absorção do ferro. Na hora antes e na hora após essa refeição principal deve ser evitada a oferta de alimentos ricos em cálcio (ex.: iogurte, fórmula infantil ou preparados com leite de vaca) por poderem interferir na absorção do ferro. Nos lanches, podem também ser oferecidos alimentos ricos em ferro (ex.: cereais fortificados, caju, tremoço) juntamente com alimentos ricos em vitamina C (ex.: kiwi, laranja, papaia, tangerina), por exemplo através de uma papa não láctea fortificada em ferro, preparada com leite materno, à qual é adicionado kiwi em puré, por exemplo. Para ter acesso a recomendações individuais, como por exemplo a escolha da melhor papa e melhor forma de a preparar de forma a promover a absorção de ferro, mas sem comprometer a ingestão de outros nutrientes, consulte um nutricionista que trabalhe na área materno-infantil para uma avaliação completa do seu caso.


Referências

  1. Horta, B. L., Bahl, R., Martinés, J. C., et al. Evidence on the Long-Term Effects of Breastfeeding: Systematic Reviews and Meta-Analysis. World Health Organization; Geneva: 2007.

  2. Baker, R. D., Greer, F. R., & Committee on Nutrition American Academy of Pediatrics. Diagnosis and prevention of iron deficiency and iron-deficiency anemia in infants and young children (0-3 years of age). Pediatrics, 2010, 126(5), 1040–1050.

  3. Fewtrell. M. Complementary Foods. In: Koletzko B, et al (eds): Pediatric Nutrition in Practice. World Rev Nutr Diet. Basel, Karger, 2015, 113: 109-111.

  4. Friel, J., Qasem, W., & Cai, C. Iron and the Breastfed Infant. Antioxidants (Basel, Switzerland), 2018, 7(4), 54.

  5. PNPAS. Alimentação Saudável dos 0 aos 6 anos – Linhas De Orientação Para Profissionais E Educadores. 2019

  6. Fewtrell, M., Bronsky, J., Campoy, C., Domellöf, M., Embleton, N., Fidler Mis, N., et al. Complementary Feeding: A Position Paper by the European Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition (ESPGHAN) Committee on Nutrition. Journal of pediatric gastroenterology and nutrition, 2017, 64(1), 119–132.

  7. ESPGHAN Committee on Nutrition. Iron Requirements of Infants and Toddlers. JPGN 2014;58: 119–129

  8. WHO Guideline: Daily iron supplementation in infants and children. Geneva: World Health Organization; 2016.

  9. Sociedade Portuguesa de Pediatria. Alimentação e nutrição do lactente. Acta Pediátrica Portuguesa. 2012;43(5)

  10. Dietary Guidelines Advisory Committee. 2020. Scientific Report of the 2020 Dietary Guidelines Advisory Committee: Advisory Report to the Secretary of Agriculture and the Secretary of Health and Human Services. U.S. Department of Agriculture, Agricultural Research Service, Washington, DC.

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